quinta-feira, 25 de fevereiro de 2016

Lisini, Rosso di Montalcino DOC, Toscana 2013 (Itália)

Vinho: Rosso di Montalcino DOC
Safra: 2013
Região: Toscana
País: Itália
Vinícola: Lisini, também chamada Azienda Lisini (http://www.lisini.it)


Um pouco de história

Cobrindo uma área de 154 hectares, a propriedade da Azienda Lisini está localizada em Sant’Angelo in Colle, a 8 km no lado sul da cidade de Montalcino. Os parreirais de Sangiovese possuem um microclima especial por serem banhados pelas correntes oceânicas provenientes de Maremma, que acarretam verões secos e invernos suaves. Com um índice pluviométrico reduzido e ausência de névoa na altitude média de 350 metros sobre o nível do mar, os solos são dotados de significativo percentual de ferro e vão do argiloso ao sedimentar arenoso.

As raízes desta propriedade datam do século 14, mas foi somente dois séculos mais tarde que os Lisini se estabeleceram na região de Montalcino. Nos anos que precederam a explosão do famoso vinho Brunello de Montalcino a companhia já era renomada por sua produção de óleo de oliva extra virgem de grande qualidade, feita a partir de oliveiras localizadas na mesma região dos vinhedos.

A primeira safra da vinícola foi lançada em 1967, coincidindo com o estabelecimento do consórcio original de doze produtores de Brunello di Montalcino. Na década seguinte suas instalações foram modernizadas e a companhia se consolidou. Elina Lisini inclusive ocupou a cadeira de presidente do consórcio algum tempo depois.


O que há de tão especial em Montalcino?

Montalcino é uma comunidade muito pequena localizada no topo de uma elevação da região da Toscana, e cujo nome vem de uma antiga variedade de carvalho que cobria o terreno há muito tempo no passado. Nem sempre a cidade e suas redondezas foram pólo de produção vinícola, mas foi com muita esperteza e muita tenacidade que os produtores da região construíram a fama dos vinhos elaborados a partir da variedade italiana Sangiovese, em especial do Brunello di Montalcino. Como mencionado acima, a formação do consórcio de produtores de Brunello foi o pontapé inicial para o estabelecimento do que hoje é um dos rótulos mais cobiçados por enófilos mundo afora, que rivalizam em preço com Barolos e Barbarescos.

Primeiro vinho a obter a certificação DOCG na Itália, em 1980, o Brunello di Montalcino precisa ser envelhecido por no mínimo 2 anos em carvalho e passar pelo menos 4 meses de descanso em garrafa antes de ir ao mercado. Apesar disso, muitos produtores trabalham seus Brunellos por mais tempo (veja mais abaixo os tempos dos vinhos da Lisini).

Em 1984 foi criada a DOC Rosso di Montalcino, cujos vinhos devem ser feitos a partir de uvas da mesma região dos Brunellos, porém com tempos mais curtos em barril (mínimo de 6 meses). A intenção original era possibilitar aos produtores lançarem vinhos jovens e de perfil mais fresco, inclusive podendo ser Brunellos "desclassificados" antes dos dois anos de envelhecimento serem completados. Por isso mesmo há muitas pessoas que se referem ao Rosso como um "Brunello baby".

Outras DOCs de menos renome também são produzidas na região de Montalcino, como o Sant'Antimo e o branco Moscadello di Montalcino. Rótulos com a indicação geográfica típica genérica Toscana IGT também são produzidos ali.


Os vinhos da Lisini

Hoje a produção dos cinco rótulos tradicionais da Lisini fica a cargo do enólogo Filippo Paoletti, que utiliza tanques de cimento, aço inox e grandes barris de carvalho eslavo para vinificar exclusivamente a variedade Sangiovese. De acordo com informações em seu website, nenhum dos rótulos passa por filtração ao final do processo.

Numa passada rápida, os cinco vinhos produzidos são os seguintes, em ordem de importância de vinificação e custo final ao consumidor:
  • San Biagio Rosso Toscano IGT - fermentado em tanques de aço inox e engarrafado em seguida;
  • Rosso di Montalcino DOC - fermentado em tanques de cimento vitrificado e envelhecido 6 meses em carvalho eslavo, com descanso de 3 meses em garrafa;
  • Brunello di Montalcino DOCG - fermentado em tanques de aço inox e envelhecido 36 meses em carvalho eslavo, com descanso de 6 a 8 meses em garrafa;
  • Brunello di Montalcino DOCG Riserva - vinificado como o Brunello tradicional porém com seleção especial das uvas e de produção limitada, somente em safras consideradas excepcionais;
  • Ugolaia Brunello di Montalcino DOCG Riserva - feito com uvas do vinhedo que lhe dá o nome, fermentado em tanques de aço inox e envelhecido 36 meses em carvalho eslavo, com descanso de mais 18 meses em garrafa.


O vinho degustado: Lisini, Rosso di Montalcino DOC 2013

Este é o primeiro Rosso di Montalcino que provei. De acordo com o site da Lisini, são produzidas de 8.000 a 10.000 garrafas por ano.

Devo dizer que o vinho correspondeu às minhas expectativas. A acidez é marcante, porém num contexto de suave rugosidade onde álcool e taninos se mesclam para proporcionar um paladar bastante equilibrado. Em suma, o álcool não se sobressai, e eu nem precisei usar o decanter. No olfato lembra uma mistura úmida de cerejas e amoras pretas, levemente terrosa.

A expressão diferenciada da qual eu estava acostumado com a maioria dos rótulos de Sangiovese que já havia provado, tanto em versões varietais quanto em blends da DOCG Chianti, deve-se provavelmente à acidez mais equilibrada. Faltou pouco para que o vinho demonstrasse aquela sensação mais pura de veludo, mas foi definitivamente uma garrafa elegante e ao mesmo tempo mais acessível ao paladar, que pode perfeitamente dispensar comida e servir de acompanhamento para uma boa conversa.

No meu caso, a combinação envolveu pizza e bacalhau com polenta ao molho vermelho (não no mesmo dia, claro).


Referências de pesquisa para este texto:
http://www.bbr.com/producer-74-lisini-tuscany
http://www.wine.com/v6/Lisini/learnabout.aspx?winery=2964&state=CA
http://www.uncorked.co.uk/offers/lisini-brunello-original-and-one-greats
http://www.bbc.com/news/magazine-21777695
http://en.wikipedia.org/wiki/Brunello_di_Montalcino

quinta-feira, 18 de fevereiro de 2016

Vinho fora de casa - Parte 2: Uma apologia da Meia Garrafa

Amada por poucos e ignorada por muitos, a meia garrafa de vinho possui um charme próprio ao trazer metade do volume de uma garrafa comum (375 mililitros, o que equivale a pouco mais de 1/3 de litro). Muito embora seja possível elencar vantagens e desvantagens do formato, a verdade é que existem muitas utilidades para ela além daquelas que são mostradas no clássico filme sul-africano Os Deuses Devem Estar Loucos.

De longe, a meia garrafa se confunde facilmente com uma garrafa de cerveja long neck, e de perto representa uma excelente maneira de apreciar um vinho sem exceder a tolerância de álcool da maioria das pessoas. No meu caso, a meia garrafa representa o volume médio ideal para se consumir como acompanhamento para uma refeição fora de casa. Nem mais, nem menos. Bem, talvez um pouco mais, mas bem pouco.

Mercadologicamente, é esperado que a disponibilidade de meias garrafas em lojas, supermercados e restaurantes seja bastante inferior à das garrafas normais. O formato diferenciado e todos os custos associados não é muito vantajoso para os pequenos produtores, e como o preço médio acaba ficando sempre acima da metade de uma garrafa normal muitos deles acabam por não poder colocar tais produtos no mercado. E há também aqueles que se recusam a fabricá-las apesar de possuírem os recursos.

Não vou entrar no mérito do vinho em meias garrafas envelhecer mais rápido que numa garrafa comum, até porque hoje em dia a esmagadora oferta disponível para nós, simples mortais, está aí para ser consumida imediatamente.


O problema da meia garrafa na maioria dos restaurantes é que sua disponibilidade nas cartas de vinho é extremamente reduzida ou mesmo completamente ausente. Longe de mim querer dar uma de sommelier, mas da posição de consumidor em que estou acredito que seria de bom tom ter ao menos 20% a 30% de opções de meia garrafa quando as comparamos ao grosso da carta – algo como 2 ou 3 opções para cada 10 garrafas normais.

Dos restaurantes que têm meias garrafas na carta, noto que é comum estas serem as versões menores das garrafas inteiras (o que é ótimo), que sejam de linhas inferiores ou de entrada, ou que dêem preferência única aos tintos. Com relação a este último aspecto, será que os brancos são tão mais leves que não justificam um estoque de meias garrafas?

No começo eu não dava muita bola para isso, mas hoje digo que sou um enófilo mais feliz sempre que me deparo com uma carta de vinhos que tenha ao menos duas boas opções de meia garrafa em cada categoria. Apesar de já ter perdido a vergonha de levar sobra de vinho para casa, cada vez mais tenho me deparado com situações onde a meia garrafa é uma saída razoável e elegante.


Nesse último feriado de Carnaval viajamos a Fortaleza, e como apreciadores da boa mesa visitamos quatro restaurantes distintos à noite. Em todos eles eu pedi uma meia garrafa para acompanhar o jantar, e para celebrar o fato faço a seguir um breve relato de cada uma das experiências:

Viña Parapacá, León de Tarapacá Chardonnay, DO Valle Central 2013 (Chile)
Degustado no restaurante Coco Bambu da Av. Beira Mar

Um Chardonnay correto com o tempo ideal de barrica. Acompanhou perfeitamente o cardápio escolhido, da entrada de lulas empanadas ao prato principal de lagostas grelhadas. O restaurante, aparentemente um dos mais badalados de Fortaleza e o mais badalado da Av. Beira Mar, tem vários ambientes e localização privilegiada. A fila de espera nos assustou um pouco, mas acho que nem chegamos a esperar vinte minutos para sentar à mesa. Muito bom, vale a pena conhecer.

Bodega Alta Vista, Alta Vista Premium Estate Malbec, Mendoza 2013 (Argentina)
Degustado no restaurante Tio Armênio do Shopping RioMar

Um típico Malbec argentino, muito potente no alto de seus 14,5% de álcool. Aromas de fruta madura e paladar concentrado, encorpado, que harmonizou muito bem com um ternero ao molho de shitake e shimeji com risoto primavera. Visualmente, a etiqueta lembra muito uma cerveja long neck! Para quem busca um lugar refinado, com boas opções no cardápio e na carta de vinhos, o Tio Armênio é escolha certa. O melhor de tudo é que os preços são bem mais acessíveis que a média para um restaurante de sua categoria, então #ficaadica!

Casa Ferreirinha, Esteva Douro DOC 2013 (Portugal)
Degustado no restaurante Outback Steakhouse do Shopping Iguatemi

Sempre que podemos durante nossas viagens damos um jeito de ir a algum restaurante da rede Outback. Devido ao feriado prolongado, essa foi a primeira vez em que tivemos que aguardar um tempo considerável para conseguir uma mesa, mas a espera valeu a pena. A escolha da meia garrafa passou por lapsos de desinformação por parte do garçom, mas depois de algumas idas e vindas decidi-me por um vinho que ainda nem constava no cardápio oficial, um blend de Tinta Roriz (Tempranillo), Tinta Barroca, Touriga Franca e Touriga Nacional marcado por taninos presentes e carvalho bastante proeminente. A harmonização foi com costelinha de porco defumada ao molho barbecue, um dos nossos pratos favoritos no Outback.

Schröder & Schÿler, Château Bel Air Bordeaux AOC 2011 (França)
Degustado no restaurante La Luna, anexo ao hotel Ponta Mar

No último dia resolvemos arriscar, e logo que entramos no restaurante cheguei a achar que não encontraria uma carta de vinhos. Como vocês podem ver eu estava enganado, e das opções disponíveis acabei por escolher este assemblage com parcelas iguais de Merlot e Cabernet Franc para acompanhar o couvert de pães e queijos e um talharim com frutos do mar. Um vinho com certa personalidade, que soa agradável ao paladar apesar de não se exibir muito no lado aromático. Nenhuma ressalva a se fazer ao restaurante, que tem bom ambiente e mostrou ótimo atendimento.

Enfim, deixo aqui meu mais sincero apreço pelas meias garrafas nos restaurantes. :)

A primeira parte desta breve dissertação sobre o ato de limitar a degustação de vinho fora de casa pode ser lida aqui. Já a terceira parte, que trata sobre o consumo de vinho por taça, pode ser lida aqui.

Um abraço a todos que têm me acompanhado e saúde!

terça-feira, 16 de fevereiro de 2016

Vinho fora de casa - Parte 1: Administrando a garrafa inteira sozinho

Todo enófilo já passou ou ainda passará pela seguinte situação: sedento por um vinho depois de um cansativo dia de trabalho, ou mesmo desejoso de saborear mais uma garrafa para simplesmente celebrar a vida e tudo o que nela há de belo, você se senta à mesa do restaurante e descobre que seu/sua acompanhante não pode te acompanhar por ordens médicas ou é do tipo de pessoa que passa todo o jantar bebericando uma taça somente.

E agora, o que fazer?

Por mais simples que pareça, tal situação implica em vários desdobramentos com os quais muitas pessoas ainda não estão preparadas para lidar, ou se sentem mesmo simplesmente desconfortáveis.

De uns tempos para cá tenho passado por isso, e após observar bastante e testar algumas das alternativas para o “problema” decidi compartilhar minhas experiências. Vou primeiramente elencar as soluções mais óbvias para o dilema, considerando sempre que o enófilo está sentado à mesa diante de uma carta de vinhos:

    Opção 1. Abrir uma garrafa (750 ml).
    Opção 2. Abrir uma meia garrafa (375 ml).
    Opção 3. Tomar vinho por taça (150~175 ml).

Falemos agora sobre a primeira opção.

Abrir uma garrafa inteira significa, em primeiro momento, que você estará propenso a tomar todo (ou quase todo) o vinho. Ainda que alguns caboclos que conheço declarem aos quatro ventos que são capazes de beber uma garrafa de vinho “brincando”, acredito que uma garrafa inteira é demais para uma pessoa normal durante um jantar com duração média de duas horas. O álcool sobe pra cabeça, afeta o discernimento, incita comportamentos inapropriados e impossibilita completamente a direção responsável. Isso é fato, e não adianta achar que o baixo teor alcoolico de um Vinho Verde vai te ajudar pois o importante neste caso é sempre pensar em segurança e moderação.

Há alguns meses atrás, numa das vezes em que saímos para conhecer um novo restaurante, encarei uma garrafa inteira sozinho só para ver como seria a experiência. Bebi tudo, até a última gota, de um Sangiovese toscano com 14% de teor alcoolico (veja abaixo). O resultado foi um mês de gozação da minha esposa, que me zoou muito sobre o derramamento que provoquei em seu suco, o apagar da vela na mesa, as risadas do rapaz do estacionamento ao me observar ziguezagueando em direção ao banco do passageiro e minhas constantes declarações de “estou bem, estou bem...” já dentro do carro.

Castellani, Le Casine Sangiovese, Toscana IGT 2013 (Itália)
Bebendo a garrafa sozinho e enfiando o pé na jaca

Obviamente, quem voltou dirigindo naquela noite foi minha esposa. Por mais que eu soubesse que era ela quem voltaria dirigindo, em determinado ponto do jantar eu já não estava em domínio de meus sentidos olfativos ou gustativos. Nem me recordo do sabor do meu prato, e tenho lembranças somente enevoadas do momento em que paguei a conta.

O que quero dizer, amigos enófilos, é que a atitude de beber uma garrafa inteira durante uma refeição fora de casa é extremamente desaconselhável, mesmo que haja alguém são para dirigir no trajeto de volta.

Por outro lado, nem tudo está perdido caso você decida por pedir uma garrafa inteira. Ora bolas, por que deveríamos beber tudo num intervalo de tempo tão curto? O que te impede de beber somente a metade da garrafa e levar o que sobrou para casa? Você está pagando pelo vinho, e a partir do momento em que chega à mesa ele é seu para fazer o que quiser.

Por acreditar que isso seja falta de etiqueta ou mesmo por timidez ou vergonha, a esmagadora maioria dos frequentadores de restaurantes não leva o vinho que sobrou consigo. Tudo bem se o que restou mal dá para limpar o fundo de uma taça, mas e se estamos diante de uma garrafa que ainda está pela metade? Amigos, não sejamos levianos com o líquido que amamos! Deixando-o na mesa, o destino é o lixo ou o paladar dos funcionários, que se forem espertos não se furtarão ao prazer de degustar um vinho já devidamente aerado assim que a mesa for limpa!

Recentemente, um de nossos restaurantes favoritos tomou a decisão de abolir sua carta de vinhos e manter somente dois rótulos na casa, algo que descobrimos de surpresa durante um jantar (em contrapartida, a rolha é livre todos os dias). Novamente diante do dilema de ter uma garrafa toda para mim, desta vez levei o que sobrou para casa e continuei degustando-a no conforto do meu lar no dia seguinte.

Bodega Septima, Septima Cabernet Sauvignon, Mendoza 2013 (Argentina)
Além de acompanhar um rodízio de massas e risotos, acompanhou-me também até a minha casa

Como podem ver, essa foi uma decisão completamente acertada, pois a metade do volume de uma garrafa é na minha opinião a quantidade média ideal a ser consumida acompanhando um jantar fora.

Em vários estados dos EUA e do Canadá, inclusive, existe uma lei que permite que os restaurantes forneçam um serviço de re-selagem das garrafas para que os clientes levem o que sobrou do vinho para casa. Sabe-se que lá é proibido dirigir transportando garrafas abertas, o que acabava motivando as pessoas a beberem tudo antes de deixar o restaurante. A lei foi criada, portanto, para coibir esse comportamento e diminuir a incidência de acidentes decorrentes de bebedeira, o que de fato aconteceu de acordo com as estatísticas. Para saber um pouco mais clique aqui, aqui ou aqui.

Infelizmente todos sabem que no Brasil a lei é bem diferente. E que beber com responsabilidade é responsabilidade absoluta de cada um.

Para encerrar, uma última dúvida que pode surgir quanto a levar o vinho que sobrou para casa é como preservá-lo. Para isto as duas principais alternativas são dispositivos como o vacu-vin ou uma boa borrifada de gás inerte assim que chego em casa. Eu prefiro esta última opção, que venho usando há meses e funciona muito bem.

E você, já levou alguma garrafa de vinho pela metade do restaurante para casa?

No próximo texto discorro sobre o consumo de vinhos em meia garrafa.

quarta-feira, 3 de fevereiro de 2016

Woodbridge Pinot Noir, California 2012 (EUA)

Vinho: Woodbridge Pinot Noir
Safra: 2012
Região: California (Lodi)
País: EUA
Vinícola: Woodbridge Winery (http://www.woodbridgewines.com)


Um pouco de história

A Woodbridge Winery teve sua origem no final da década de 70, por iniciativa de um dos grandes nomes da história vitivinícola norteamericana e mundial, um sujeito visionário chamado Robert Mondavi.

Dada a importância de Mondavi para o mundo do vinho, é praticamente impossível falar dos vinhos Woodbridge sem considerar também seus outros empreendimentos, como a primeira vinícola que ele estabeleceu em Napa Valley. Na época da fundação da Woodbridge, Mondavi já trabalhava e desfrutava de excelente reputação com a Robert Mondavi Winery, que curiosamente surgiu a partir de uma terrível briga familiar. Foi na vinícola que leva seu nome, por exemplo, que ele criou e popularizou os vinhos Fumé Blanc feitos a partir de Sauvignon Blanc com passagem por madeira. O sucesso foi tanto que até hoje algumas pessoas acreditam que Fumé Blanc seja uma variedade distinta de uva branca.

Disposto a ampliar sua influência e diversificar suas atividades, Mondavi iniciou dois empreendimentos absolutamente distintos em 1979. No mais nobre deles, estabeleceu uma joint venture com o grupo francês Château Mouton Rothschild em plena Napa Valley. Mais tarde batizado de Opus One, o arrojado projeto foi o primeiro a vender um vinho de categoria premium nos Estados Unidos – um blend que leva o nome da vinícola e tem a Cabernet Sauvignon como principal componente, e que veio a se tornar um ícone caríssimo com o passar dos anos.

O outro empreendimento iniciado por Robert Mondavi em 1979 foi exatamente a fundação da Woodbridge Winery, que tinha como objetivo a produção de vinhos de qualidade destinados ao consumo do dia-a-dia (leia-se: mais baratos e acessíveis). Localizada na região de Lodi, que também é uma AVA, a vinícola era originalmente uma cooperativa de produtores que foi rebatizada com o nome da cidadezinha mais próxima.

Mesmo sem contar com a reputação de suas irmãs mais badaladas, nas décadas seguintes a Woodbridge se tornou muito conhecida devido à grande visibilidade junto à população em geral e à presença nas garrafas do chamativo complemento “by Robert Mondavi”.


A Woodbridge Winery hoje

Pode ser que em outros tempos Mondavi tenha tido certa influência na vinificação dos vinhos Woodbridge. Hoje em dia, no entanto, a realidade é muito mais comercial e menos glamorosa. Após se tornar uma companhia de capital aberto nos anos 90, o grupo Mondavi cresceu e estabeleceu parcerias em várias partes do mundo. Porém, num ambiente constantemente marcado por disputas familiares, em determinado momento o homem chegou a se declarar descontente com o foco que seus filhos davam à linha Woodbridge, que apesar de responder por mais da metade do faturamento das empresas teria colocado os vinhos de mais alta gama do grupo em segundo plano, arranhando sua imagem.

A celeuma continuou, e infelizmente as empresas de Mondavi acabaram sendo arrebatadas pela gigante Constellation Brands em 2004. Apesar de prosseguirem debaixo do mesmo grupo e operarem com certa independência, as vinícolas já não tinham membros da família envolvidos no negócio, e desde então carregam o nome Mondavi puramente por herança comercial.


Mondavi após Constellation Brands

E o que foi feito da família após a venda do grupo Mondavi?

Praticamente todos os membros, incluindo o patriarca, se uniram num novo empreendimento chamado Continuum Estate, localizado em outra sub-região de Napa Valley. Mondavi faleceu em 2008 aos 94 anos, mas seus filhos e netos seguem trabalhando em Continuum Estate para produzir um único vinho que tenta seguir o molde de excelência criado com o Opus One.


Os vinhos da Woodbridge

Existem duas categorias de vinhos produzidos pela Woodbridge Winery.

O Woodbridge by Robert Mondavi é distribuído em todo o mundo, sendo facilmente encontrado em lojas e supermercados. A linha engloba exemplares aparentemente varietais das cepas mais conhecidas. Digo “aparentemente” porque a composição de muitos destes vinhos, apesar de trazer somente um tipo de uva no rótulo, leva parcelas menores de outras cepas. Todos saem com a denominação genérica California, uma vez que são feitos a partir de uvas provenientes de diferentes produtores.

A segunda categoria, denominada Winemaker’s Selection, compreende uma gama de vinhos mais elaborados, que carregam no rótulo a AVA Lodi e incluem variações interessantes feitas a partir de castas autóctones italianas e portuguesas, além do já mencionado Fumé Blanc. O motivo de não podermos encontrar estes vinhos em lojas brasileiras é que eles são vendidos somente na própria vinícola ou distribuídos em seu clube exclusivo, chamado Heritage Wine Club.


O vinho degustado: Woodbridge Pinot Noir, California 2012

Aromas de cereja e frutas azedinhas, seguido por paladar de corpo leve, marcado por sutil presença de carvalho contra estrutura de pouco tanino, o que termina por prover maciez moderada ao vinho.

Esse exemplar da linha Woodbridge é correto, e cumpre o que promete desde que não se crie grandes expectativas. Está longe de ser um vinho ruim ou desequilibrado, mas fica a dúvida de até onde ele pode ser considerado um Pinot Noir puro. Os dados da vinícola dizem que na composição entram também Syrah (11%), Tempranillo (2%), Cinsault (2%), Tannat (2%), Alicante Bouschet (2%) e mais 2% de um blend proprietário de varietais tintos. O percentual de Pinot Noir é de 79%.

O vinho foi harmonizado com paleta de cordeiro acompanhada de arroz, batatas e brócolis, tendo sido escolhido para participação no segundo evento da confraria virtual Viva o Vinho.

Saúde!


Referências de pesquisa para este texto:
http://www.woodbridgewines.com/Inside-Woodbridge/winemaking.php
http://www.woodbridgewines.com/Inside-Woodbridge/mondavi-history.php
http://en.wikipedia.org/wiki/Robert_Mondavi
http://en.wikipedia.org/wiki/Opus_One_Winery
http://www.nytimes.com/2003/07/02/dining/wine-talk-with-head-held-high-mondavi-at-90-faces-a-storm.html
http://www.decanter.com/wine-news/colossus-robert-mondavi-dies-82224